O que é verdadeiramente ser humano? Quais as consequências morais de fazer o papel de Deus? E quando nos esquecemos delas, quais as implicações disso na nossa vida?

Blade Runner - O inicio

No inicio do séc. XXI, a TYRELL CORPORATION levou a evolução dos robots até à fase NEXUS – um ser virtualmente idêntico a um humano – conhecido como Replicante. Os Replicantes NEXUS 6 eram superiores em força e agilidade, e eram pelo menos iguais em inteligência, aos engenheiros genéticos que os criaram. Os Replicantes eram usados fora da Terra como mão-de-obra escrava, na perigosa exploração e colonização de outros planetas.

Depois de um sangrento motim de uma unidade de combate de Replicantes NEXUS 6 numa colónia fora da Terra, os Replicantes foram declarados ilegais no planeta – sob pena de morte. As unidades especiais de polícia – Unidades de Blade Runners – tinham ordens para atirar a matar, assim que detectassem qualquer Replicante transgressor. A isto não era chamado de execução. Era chamado de reforma. Los angeles 2019.

Um pequeno grupo de Replicantes (ciborgues artificialmente criados através da engenharia genética, mais próximos dos clones do que dos robôs e banidos da terra depois de uma revolta sangrenta), liderado por Roy Batty, regressa à Terra em busca do segredo da vida, algo que lhes permita ultrapassar o limite de 4 anos com que os seus corpos são programados. Nessa altura, um antigo Blade Runner (policias especialmente treinados como detectives e caçadores de recompensas), Rick Deckard, é chamado para voltar ao activo e reformar (do inglês retiring) de vez, os Replicantes rebeldes.

A cena inicial do filme mostra-nos bocas-de-fogo que explodem sem parar numa noite de luzes. A associação a uma realidade pós-apocalíptica é imediata, sem necessidade de expressa declaração. As ruas da cidade mostram-se imundas, repletas de sub-gente (como lhes chama Bryant, chefe da Unidade Blade Runners quando diz a Rick Deckard ‹‹You know the score, pal. If you’re not cop, you’re little people.››).

Sabemos que tem que haver quem viva outras vidas pois as sensações de sufoco e atrofio que as imagens dos prédios em volta nos dão só podem vir de mais gente, que imaginamos parada, nos sofás, frente e ligada a máquinas. No entanto, não entendo nisto uma construção da tecnologia como sendo por natureza maléfica. Deckard diz aliás em certa altura:

Replicants are like any other machine. They can be a benefit or a hazard.

Como entende Jyanni Steffensen em Decoding Perversity: queering cyberspace, a crescente dificuldade em destrinçar os humanos dos Replicantes vai minando a dicotomia positivo/negativo de natureza/tecnologia.

Olhos. Janelas da alma

Blade Runner - Olhos Janelas da Alma

Um olho gigantesco faz a ponte para a cena seguinte mas serve ao mesmo tempo para nos chamar à atenção desde logo, para a importância do globo ocular no desenrolar da história. Se no Frankenstein de Mary Shelley, o olhar da criatura mostra a sua inumanidade, em Blade Runner é  através do olhar que a mesma pode ser comprovada.

Os Replicantes são detectados através de uma máquina, Voight-Kampff,  que mede algumas das emoções humanas através de respostas biológicas como a dilatação involuntária da íris, uma versão reminiscente da máquina de Turing. Os Replicantes usam os olhos só para ver enquanto os humanos expressam por eles algumas das suas emoções. A ausência de tais emoções, particularmente, as provocadas pelas memórias, é a confirmação da chamada condição inumana.

A condição inumana e a representação de humanidade

A condição inumana dos Replicantes é talvez a maior representação de humanidade no filme. Os Replicantes colocam questões filosóficas sobre a sua existência. Querem, de certa forma como os humanos, saber quem são e o que fazem aqui. Marcel Danesi em Messages, signs, and meanings: a basic textbook in semiotics and communication diria que é  uma consciência do Eu a despontar.

Também o surgir das emoções, memórias e até as fotografias que as sustentam, elevam a névoa na distinção entre homem e máquina. Veja-se o caso de Rachel, a Replicante femme fatale , ícone da problemática Replicante, nunca sendo o que parece, por quem Deckard acaba por se apaixonar. Rachel não tem conhecimento de ser um Replicante. É na relação com Rachel que Deckard se interroga pelo contrário. A sua falta de sentimento, a sua frieza para com a função que lhe foi incumbida, de “reformar” os Replicantes, será porventura sinal dele próprio estar além da humanidade.

Mais humanos que os humanos

Também a representação dos humanos como menos humanos do que seria de esperar não é inocente. Veja-se quando de entre os humanos temos Gaff o polícia, que é coxo, Chew o fabricante de olhos, que parece saído de um livro fantástico ou J.F. Sebastian, o engenheiro genético que sofre de envelhecimento acelerado (para não referir novamente as criaturas mutantes que controlam as ruas).

É entre os Replicantes e não entre os humanos, que se visualiza um conceito de família. Eles sofrem uns pelos outros, na perca e na paixão que os leva a agir em busca do seu objecto de desejo: vida.

Mas ao mesmo tempo que estes Replicantes parecem ser verdadeiros humanos, eles parecem ser também, paradoxalmente “Mais humanos que os humanos” (More human than human é o slogan, a assinatura da Tyrell Corporation, criadora dos Replicantes.) principalmente o seu líder, Roy Batty.

A ver vamos se amanhã continuamos a conversa.

p.s. Se eu podia escrever sobre qualquer outra coisa hoje? Podia. Mas não seria a mesma coisa…

Ernst Stavro Blofeld e o seu gato
Estarei a criar a futura líder do SPECTRE?

Sentada no cadeirão, com o Browser ao colo e enquanto lhe faz umas festas na cabeça, diz a Patrícia:

Pai, sabias que todos os génios do mal se sentam no cadeirão com um gato ao colo enquanto fazem os seus planos?

Tremo por breves instantes, revejo toda a estratégia educativa numa fracção de segundo e logo de seguida penso “Se não for eu a conquistar o Mundo, então que sejas tu”. E respondo:

Pois é. Curioso filha, muito curioso…

A nossa ideia de ver todos os filmes de James Bond até à estreia de Skyfall já foi por agua abaixo… Bem, já vimos um, o primeiro, James Bond, Dr. No. É um começo certo?

James Bond Skyfall no browserd.com

Como já estou certo de que tão cedo não temos disponibilidade para ver mais, ao menos que nos calhe o dito Skyfall e se tudo correr bem, pode já ser no próximo fim-de-semana que não me importo nada…

Há já muito que um trailer de James Bond não me causava grande impacto ou pelo menos, não me despertava tanto interesse. Com Skyfall parece haver um back to basics, um James Bond mais negro?

A ver vamos se o filme cumpre o prometido.

Pergunta a Patrícia mais ou menos a meio de Star Trek: First Contact. Há Star Trek sem Spock?

Ontem ao final da tarde, momento de família  Pai, mãe (por breves minutos e desconfio que só com um dos olhos aberto) e filha, no sofá, a ver Star Trek: First Contact que estava a passar num dos canais da ZON (TV Cine qualquer coisa se não me engano). E sim, a Patrícia trocou no alto dos seus 8 anos, os livros do quarto, os jogos e os filmes de animação do seu PC, pela televisão da sala, para ver Star Trek.

Star Trek First Contact

Foram quase duas horas de explicações detalhadas sobre a Enterprise, os Borg e viagens no tempo. Pelo meio ainda se levantaram questões sobre amor inter-espécie  e interfaces cibernéticos (percebo que as cenas entre Borg e Data não sejam de fácil entendimento por uma miúda de 8 anos mas ainda assim, não correu mal de todo).

Se prestei a atenção devida ao filme? Claro que não mas afinal, que é que isso interessa? Eu já tinha visto o filme e voltarei a ver certamente mas o que interessava realmente era que a Patrícia o estava a ver. E a gostar.

Sim, cada vez mais me convenço que não vai ser fácil, mas estou desejoso de ver o que o futuro nos reserva…

Numa nota final há ainda a registar que a Patrícia ficou muito agradada ao ver que afinal sempre apareceram Vulcanos no filme mas questionou-se porque não conseguia Zefram Cochrane fazer a saudação deste povo… “É tão fácil não é pai?”…

Foi dia de Bond. James Bond. Pelo menos lá por casa.

Decidimos rever toda a série de filmes em torno do mais famoso agente secreto da história do cinema e, como podem imaginar, será tarefa para durar algum tempo e como tal, mais vale começar o quanto antes. Como o principio é sempre um bom começo, o fim de tarde de Domingo foi dedicado a Dr. No, o primeiro filme de James Bond.

Dr No Poster Original

Tal era a certeza de que James Bond seria um sucesso, que os cartazes publicitários do filme anunciavam claramente: “O primeiro filme de James Bond”. Sim, o primeiro de muitos. Muitos filmes, muitos James Bond’s.

Voltando a Dr. No, corria o ano de 1962 quando estreou, baseado no livro de Ian Fleming que tinha o mesmo nome, editado 4 anos antes. O nome do filme é o nome do primeiro vilão de uma gigantesca galeria que há-de vir, Dr. Julius No, e ainda bem que cedo nos informam sobre o seu ascendente familiar pois, não fosse isso (e a posterior explicação do mesmo sobre os seus pais) e nem as roupas super estilizadas que Joseph Wiseman usava o identificariam como chinês… Era o que se podia arranjar à altura.

Espiões e Sex Symbols? Sucesso garantido.

Foi também em Dr. No que surgiu uma das mais icónicas Bond Girls de sempre (bem, bastava-lhe ser a primeira mas não terá sido isso certamente a garantir-lhe o estatuto, além do mais, em verdadeira justiça, a primeira conquista de Bond no filme terá sido Miss Taro), Honey Rider, representada pela actriz Ursula Andress, sex symbol dos anos 60. Mais um argumento de peso para o sucesso comercial do filme.

Ursula Andress como Honey Rider

O sucesso comercial não significou porém a aceitação da critica. Viviam-se os tempos da Guerra Fria e, dos comentários do Vaticano sobre o “conteúdo sexual” do filme, aos comentários do Kremlin sobre como Bond representava o demónio capitalista, as criticas choviam. É claro que tudo isto ajudava a que o filme fosse ainda mais falado e logo, mais visto.

Sean Connery, para muitos o verdadeiro 007, jogava já todos os seus trunfos para cima da mesa: o charme, a destreza física, a irreverência. Mas tal como os gadgets que ajudaram à fama do personagem (e que neste filme ainda não se deram a brilhar), os tais trunfos seriam inesgotável nos seis filmes em que voltaria à personagem. Estava para ficar.

James Bond, 50 anos depois

50 anos depois, Dr. No continua a ser um bom momento de diversão. Estranho até, que mesmo perante os incríveis penteados e a frenética forma de dançar (sim, a acção decorre na Jamaica, era impensável não haver cenas de dança), não me tenha ocorrido a imagem de filme datado, como tantas vezes acontece ao rever filmes antigos.

Definitivamente, uma saga a rever do principio ao… Bem, continua no próximo filme.