Noélia e Jerónimo. Os dedos das mãos e dos pés, da família, não chegam para contar as vezes que recomendei este restaurante desde que o conhecemos, faz hoje precisamente um ano.

Em Setembro do ano passado, no fim de um longo dia de praia, combinamos jantar com um casal amigo e filhos. Depois de um dia inteiro a tentar ligar para o Noélia e Jerónimo, que nenhum de nós conhecia, finalmente fomos atendidos ao final da tarde, só para nos dizerem que já não tinham mesa para esse dia. O Ricardo, do tal casal, não se deu por vencido e decidiu que iria até Cabanas de Tavira, ao restaurante, na esperança de que uma mesa vagasse. Bendita a hora em que o fez. Depois de esperarmos cerca de uma hora à porta do restaurante, lá chegou a nossa vez. E nessa noite tivemos um dos melhores jantares que alguma vez nos foi servido em terras algarvias.

De memória nos ficaram o atendimento simpático, tudo quanto nos puseram na mesa e até a amabilidade da própria Noélia que, ao fim do jantar veio à nossa mesa perguntar se tudo tinha estado do nosso agrado. Logo ai recebeu os nossos maiores elogios. Mas que maiores elogio se poderá dar a um restaurante, para além da genuína recomendação, do que lá voltar?

E assim sim foi. Um ano depois, voltámos ao Noélia e Jerónimo.

Tentámos uma vez mais telefonar para o restaurante mas, a exemplo do que já nos tinha acontecido, não tivemos a sorte de ser atendidos. Fomos à sorte, confiantes de que abrindo o restaurante às 19h00, chegando um pouco antes disso talvez conseguíssemos mesa. Chegámos ao Noélia e Jerónimo eram 18h45. A esplanada já estava cheia (duas mesas de dois lugares vazias) e na sala, todas as mesas, ainda que vazias, ostentavam já o sinal de reservado.

Deixámos o nome na lista de espera. Só havia uma familia de 3 pessoas à nossa frente, Talvez não demorasse assim tanto pensámos. Demorou. Uma hora e meia depois, durante a qual ficámos à entrada da esplanada olhando para as mesas da sala que continuavam na sua grande maioria, vazias, fomos chamados. Menos mal.

Uma hora e meia à porta de um restaurante. Quem nos conhece sabe que não somos destas coisas. Esperar não é algo que nos choque mas uma hora e meia? Sim, nós tínhamos ficado verdadeiramente impressionados com o Noélia e Jerónimo.

A simpatia do Francisco, o responsável pela nossa mesa, não teve o que se lhe apontasse. Referimos a nossa anterior passagem pelo restaurante e umas quantas leituras sobre o mesmo. Da experiência própria pedimos para começar uma sopa de peixe para cada um. Não desiludiu. Tal como a anterior, muito saborosa e com peixe, coisa que nem sempre se vê em sopas do dito. Um pouco mais rala que o ano passado e com massa, outra inovação.

Também levados pelo que já conhecíamos, pedimos o bife de atum braseado acompanhado de arroz de gengibre e manga, ao que parece, um doss clássicos da casa. O ano passado o arroz de gengibre não tinha manga e sim amêndoas. Disse-nos o Francisco que acontece. Amêndoas tem sempre. Manga quando há. Por vezes tem framboesa. Venha de lá isso.

Já levados pelas leituras das muitas reviews que se encontram pela Internet, resolvemos pedir o famoso polvo frito com batata doce frita. Confirmam-nos: é um dos pratos com mais saída. Infelizmente, foi a primeira desilusão.

Noélia e Jerónimo Polvo Frito
Polvo Frito com Batata Doce. Se os olhos comem, ficamos com fome

O polvo estava saboroso, estava. As batatas doces fritas estavam efetivamente muito, muito boas. A combinação funciona mas não basta mandar duas coisas que combinam para dentro da travessa para ter um grande prato. Sendo que os olhos também comem, só por aí ficaríamos com fome. A apresentação torna o famoso polvo numa coisa banal, capaz de ser servido em qualquer outro sitio que não no Noélia e Jerónimo, onde tantos pratos que passam parecem ter um cuidado de artista no empratamento.

Mas o pior estava para chegar, o bife de atum braseado.

Quando temos termo de comparação e a fasquia é alta é normal que o que quer que venham em segundo dê azo a emoções fortes. Se a experiência for superior é de elevar a chef aos píncaros, que se supera, que evolui. Por outro lado, se a experiência for mais fraca será sempre uma desilusão. Desta feita, a experiência foi mais fraca, muito mais fraca.

Há muito que aprendi que a desilusão pode ser uma coisa boa (terei lido Heidegger cedo demais?), o desfazer da ilusão, o clarear da ideia. Aquilo que revela a verdade. Pois se esta é a verdade, esta desilusão é das grandes.

Noélia e Jerónimo Bife de Atum Braseado
A dose de Bife de Atum Braseado que nos foi servido este ano

O que nos foi servido no fundo de um prato fundo não era um bife de atum. Eram pedaços de atum, cortados sem forma, de pontas de posta, cobertos de nervo. O bom atum do ano passado em nada se compara a este. Nem na forma, nem na textura e confesso, nem no sabor. E se ao Miguel Esteves Cardoso, também presente esta noite neste que considera “o melhor restaurante de sempre“, a Noélia “avisa logo se o atum é sublime (desviado dos japoneses que o pagam a 100 euros o quilo) ou meramente muito bom“, ao que parece, aos restantes Clientes essa nota passa ao lado. Tivesse eu sabido que não teria um bife de atum mas sim os tais pedaços unidos por nervo e certamente teria pedido outro prato.

Noélia e Jerónimo Atum Braseado
O Atum Braseado que nos foi servido o ano passado

Mas a coisa não ficou por ali. Na mesa ao fundo da sala estava o Jorge Palma e tudo o que me vinha à cabeça ao olhar para o “Arroz de Gengibre com Manga” era “deixa-me rir…. O prato de arroz que acompanhava o atum era uma daquelas visões que nos fazem pensar se nos enganámos na porta. De repente, estamos num daqueles cafés da baixa lisboeta onde se serve bitoque atrás de bitoque, sem cheiro, sem sabor e onde a única cor é dada pelas falripas de cenoura em cima da forma de arroz branco de hospital. Quase. Tinha cheiro e sabor, a queimado, das amêndoas que torraram demais. E tinha cor, dada pelos parcos pedaços de manga mole e sem graça que trazia no topo. De resto, estava espapaçado e insosso, como o tal arroz de hospital. Não o comemos.

Noélia e Jerónimo Arroz de Gengibre e Manga
Arroz de gengibre e Manga. Sim, os pontos pretos são amêndoas queimadas

Claro que chamámos o Francisco e que lhe explicámos a situação. O bife de atum que não era bife, o arroz que estava intragável, o Noélia e Jerónimo que não tinha nada a ver com o Noélia e Jerónimo do ano passado. De imediato nos disse que ia passar a informação à Chef. Acredito que a tenha passado. Mas acredito porque esta noite decidi ser boa pessoa e acreditar que os outros também podem ser boas pessoas. Só por isso, não porque tivesse qualquer palavra de atenção.

Salvou-se a noite pelo bife de vaca que a Patrícia comeu e que, ao que parece e ela conta, estava mesmo muito bom e pela garrafa de Crasto 2015 que bebemos mas sinceramente, pelos 80 euros que pagámos, esperávamos no mínimo algo como o que tivemos no ano passado. Nem de perto nem de longe.

O Noélia e Jerónimo foi uma desilusão. Das grandes. E por mais que o Heidegger me diga que a desilusão é uma coisa boa, esta não é boa para ninguém. Não é para mim e para a Susana que deixámos de ir a outros sítios que gostamos para ir ao Noélia e Jerónimo e viemos de lá insatisfeitos e não é para o Noélia e Jerónimo que deixam de ter a nossa visita e recomendação. Se lhes faz mossa? Talvez não mas não será por isso que deixo de escrever.

p.s. Diz o meu amigo Artur Ventura que eu só escrevo quando me pisam os calos ou quando me chateio num restaurante. Não é bem assim mas admito que este foi um daqueles casos que não podia deixar para amanhã.

O bacalhau estava no ponto. E infelizmente, as coisas boas a dizer do food corner do Chef Alexandre Silva no Mercado da Ribeira ficam por ai.

Acredito que outras pessoas tenham outras experiências. Acredito até, que numa outra visita possamos ter uma experiência diferente. Infelizmente, a visita que fizemos aos espaço do Chef Alexandre Silva este fim-de-semana, foi mesmo assim, menos boa.

Da ultima vez que tinhamos passado pelo Mercado da Ribeira para almoçar, chamou-nos a atenção a carta do espaço do Chef Alexandre Silva. Ainda que os pratos de carne se apresentassem com nomes particularmente atractivos (Barriga de Porco confitada, Hamburguesa de Boi ou Foccacia de Secretos), era por peixe que procurávamos nessa tarde e, coisas como Pica-Pau de Atum ou Bacalhau Confitado pareceram-nos boas apostas. Infelizmente, o Pica-Pau tinha acabado e isso desmotivou a estadia. Ficaria para uma próxima.

Regresso ao spot do Chef Alexandre Silva

E a próxima foi agora. Uma vez mais no Mercado da Praça da Ribeira para almoçar. Lá fora um calor infernal, lá dentro… Bem, se o Inferno (como dizia o Dante) tem sete níveis, digamos que estávamos no terceiro (ainda que não houvesse neve negra).

Mercado da Ribeira Pedro Rebelo

Depois da aventura que foi arranjar espaço para sentar (e sim, nós sabemos que a regra é primeiro ir buscar a comida e depois encontrar lugar mas convenhamos, isso resulta na maior parte das vezes em infindáveis minutos vagueando pelo recinto de tabuleiro na mão com todos os riscos que tal acarreta), lá fomos até ao espaço do Chef Alexandre Silva e, mantendo a carta a mesma oferta, foi simples a escolha: Bacalhau Confitado, salteado de broa, batatinhas, chouriço e azeite de trufa e, Pica-Pau de Atum, batata doce assada com mel e kimchi.

O tempo de espera não foi muito e isso poderia ser um ponto a favor mas, desculpem-me os menos críticos, vou ficar-me pelo elogio inicial: o bacalhau estava no ponto.

Os pratos do Chef Alexandre Silva

Se é certo que o bacalhau estava cozinhado no ponto, o mesmo não poderemos dizer das “batatinhas”. Aliás, como disse a Susana, dificilmente identificaríamos as “batatinhas” se não soubéssemos do que se tratava. Minúsculos cubos, quase cabendo entre os dentes do garfo, uns aparentemente salteados, outros literalmente crus. A broa, que deveria vir salteada, não a chegamos a ver ainda que acreditamos ser a base do caldo em que o bacalhau vinha a “nadar”. Sem um sabor distinto, uma base farinhenta que de tão fina não se conseguia “apanhar” com o garfo. Teria eventualmente um qualquer sentido se, pelo sabor adicionasse algo aos restantes elementos do prato mas nem por isso.

Bacalhau Chef Alexandre Silva Pedro Rebelo

Contrariamente ao caldo, já o chouriço, igualmente cortado em cubos diminutos, era de tão forte sabor que, mesmo não estando presente na garfada, facilmente fazia olvidar qualquer outro sabor do prato. Bacalhau? Estava no ponto. Sabor? Sabia a chouriço.

Veio depois o Pica-Pau de Atum e, sendo certo que não há tanto a apontar, é também certo que não havia muito por onde o fazer. Cubos de atum, ligeiramente (muito ligeiramente) braseados, parcos pedaços de batata doce assada e umas quantas folhas de rúcula pingadas, muito ao de leve, a mel.

Atum Chef Alexandre Silva Pedro Rebelo

Não digo que soltassem a fúria das sementes de sésamo ou papoila sobre o atum mas, sendo o braseado tão fraco, os pequenos pedaços de peixe pecavam por falta de textura sendo  a existente era um pouco bacenta e faltando algo de crocante que um toque mais de brasa lhe poderia dar.

Resumindo um desabafo que já vai longo, não ficámos convencidos. Aliás, nada convencidos. Acredito que noutro forum os pratos do Chef Alexandre Silva possam ter outro brilho, outro sabor mas, no seu espaço do Mercado da Ribeira, não nos vejo a repetir a experiência.

“Então e o que vamos comer? Que tal irmos ao Talho?”. A ultima vez que tive esta conversa tive que explicar ao meu interlocutor que me referia ao restaurante O Talho. Ainda que se possa passar por lá, comprar uma boa peça de carne e levar para cozinhar em casa pois o restaurante é só parte do todo que é O Talho. A outra parte é, como já perceberam, um talho.

Ele é talho, é restaurante… É o restaurante O Talho.

Mas sem complicar, vou falar-vos do restaurante O Talho mais precisamente da minha última passagem por lá, no dia em que se comemorava o primeiro aniversario da casa.

Chef Kiko no restaurante O Talho by Pedro RebeloO Chef Kiko Martins teve a amabilidade de me convidar, juntamente com um grupo de ilustres comensais (Alexandra Prado Coelho (do Mais Olhos Que Barriga), Duarte Calvão, Miguel Pires, Paulina Mata (do Mesa Marcada), Raul Lufinha (do Mesa do Chef) – desculpem se esqueci alguém) para um almoço onde, para além de provarmos alguns dos principais pratos da casa, nos proporcionou também a possibilidade de ter uma animada conversa sobre a (ainda curta) história do espaço, as suas principais linhas orientadoras e conceitos.

Obviamente falámos também do estado da restauração em geral e de como esta tem mudado, evoluído, nos últimos anos. Em suma, um convite que, presumo eu, respondeu ao esperado: bons momentos em torno de uma boa mesa.

Estes bons momentos começaram com uma agradável conversa no talho propriamente dito. O espaço gerido pelo Chef Kiko, para além de restaurante é também aquilo que lhe dá nome, talho, onde podemos encontrar bons cortes das melhores carnes e peças já transformadas. Apresentada a equipa somos de igual forma “apresentados” a alguns dos tais cortes, porventura menos comuns mas que aguçam a curiosidade e abrem o apetite. Este falatório foi acompanhado entre outras coisas, por uns croquetes de cozido à portuguesa que, só vos digo, deixam boa memória.

Para começo de conversa no restaurante O Talho

Passámos à mesa propriamente dita e ai, um verdadeiro festival de sabores. Lugar comum na escrita é certo mas, na falta de melhor expressão, não me coíbo de a usar. Como chamar a uma refeição onde se inclui um Rosbife Asiático, finos pedaços de Alcatra acompanhados de sabores vários mais típicos de sabores a Este, finos fios de massa de arroz e uma ostra? Sim, o mar em prato de carne…

Não bastasse o regozijo já conseguido, serve-se um carpaccio que, para surpresa dos presentes, se faz acompanhar de umas já conhecidas e alaranjadas ovas de salmão. Uma vez mais, um contraste de gosto inesperado mas nem por isso menos cativante. Pelo contrário.

Mas venha de lá a refeição principal. E num talho…

O gosto da carne continuaria com um daqueles pratos que dá nome à casa (estranho, considerando que aparentemente pouca gente costuma referir o gosto pelo mesmo): O bife tártaro. E que bife tártaro. Conhecem o termo paixão à primeira vista (sim, que aquilo não era amor, tal o deleite com que rapidamente se consumiu)? Está ali, naquele prato.

A carne bem limpa, de cor ideal, fresca à vista e com o toque de gordura requerido. Bem cortada, picada à faca (sim, contrariamente ao que alguns pensam, o bife tártaro não é com carne moída), envolvida com a dose certa de alcaparras a dar o sal e chalotas para adocicar e ligada com a gema de ovo, subtil o quanto baste para não ganhar em sabor à carne. Sobre uma leve maionese de rábano, o toque mais agreste que ali faltava, vem à mesa com folhas de alga nori, sugerindo assim uma vez mais, um toque asiático e, de alguma forma quase subconsciente, outra vez o mar. Mistura-se, faz-se um rolo, saboreia-se com um trago de vodka.

Detalhes da refeição no restaurante O Talho

Uma refeição em que se louvava a carne e o gosto da mesma assim como a arte de quem a sabe trabalhar. E o Chef Kiko (com a sua equipa) sabe. Mais provas fossem necessárias (não eram), veio para a mesa uma trilogia de carnes. Poderia ser só um trio mas entendi a oferta como algo com uma linha, um caminho. No prato, e nesta ordem, uma Vazia fresca de vitela Maronesa, uma ponta de Acém maturada cerca de 3 semanas e uma Picanha do Uruguay. O prato queria nitidamente mostra-nos o valor da peça do meio. Nada a apontar a qualquer uma das outras carnes que se apresentaram como defensoras do seu bom nome mas, foi a peça maturada que deu o tal brilho especial ao prato. Fazendo-se acompanhar de uns mini-legumes que davam o toque meio crocante em contraste com o macio da carne, todo o prato era perfeito.  Ide. Ide e experimentai.

A sobremesa faz parte. E aqui, a carne ficou de fora.

Complementou-se todo este manjar com um toque de doce entre o amendoim (coisa que por norma não me lembro na sobremesa) servido em gelado, também de igual forma a banana e ainda o doce de leite que vem pastoso e muito doce, acertando a combinação com o fresco e o crocante do resto do prato, apelando nos sentidos a uma associação à america do sul e, por inerência de sabores, às carnes que nos foram servidas anteriormente.

Resumindo, o restaurante O Talho foi bem revisitado aquando do seu primeiro aniversário, num almoço memorável onde tive o gosto de conhecer pessoas bastante interessantes e que, tal como eu (independentemente de o fazerem e mostrarem de formas diferentes) nutrem especial apreço por uma boa mesa e por aquilo que nela se serve assim como por partilhar essas mesmas experiências.

Ao Chef Kiko Martins, uma vez mais o meu muito obrigado e o desejo de muitos e bons anos a levar o restaurante O Talho por bons caminhos.

Ora muito bem, aqui fica um daqueles posts que aparecem do nada, sem mais nada, porque sim. Porque o restaurante Ambiente com sabores me desiludiu.

Dissabor é um desgosto. É um sentimento que surge aquando de uma frustração em algo que era expectável ser de particular agrado. Aconteceu no Ambiente com sabores.

Há na ilha Terceira, nos Açores, mais precisamente em Angra do Heroísmo, um restaurante que dá pelo nome de Ambiente com sabores. Ao procurar um sitio para jantar, e tendo muito boas sugestões mas todas elas fora da cidade, optei por visitar o Trip Advisor e ver que ideias ele me daria. Ainda que a referência ao Ambiente com sabores não fosse a melhor (a primeira review tinha como titulo “A não voltar”) resolvemos ainda assim ver como era. Fica relativamente perto do hotel onde estamos alojados e ao passar à porta, pareceu agradar (não olhámos para a entrada convenientemente, mas já lá iremos).

Subimos umas escadas ao primeiro andar. A primeira pessoa que encontrámos foi a quem dissemos “Somos 3 para jantar”. Não tivemos uma resposta mas fomos “apontados” a outra pessoa que aparentemente nos iria receber. A primeira desapareceu entretanto.

Foi-nos dito para escolher mesa, se preferíamos alguma sala em particular. “Não conhecemos o restaurante, se nos quiser mostrar as salas…”. Passada a primeira e a segunda, uma terceira nos agradou. Ainda nos foi sugerido que ficássemos noutra “mais fresca.”, mas gostámos daquela.

Sala no Ambiente com Sabores

A sala com estilo. Vermelhos, pretos e brilho de metal, a colmatar nos candelabros das mesas que davam um toque de requinte, convidavam a ficar. Já a pessoa que nos acompanhou à mesa, nem por isso. Adiante. Enquanto esperávamos a ementa comentámos os marcadores de mesa. Marcadores de metal são um elemento de brilho que funde conceitos urbanos e rústicos de uma forma que costuma funcionar no entanto carregam um problema com eles. Com relativo uso, tornam-se feios, “usados”. E se o estilo funciona num conceito mais rústico, deixa de funcionar no tal conceito urbano.

A ementa chegou. Cada um dos pratos vem com uma descrição quase poética, daquelas que enche os olhos. Entradas, quatro pratos principais de peixe e outros tantos de carne. Nestes bifes e no peixe a comum Abrotea em filete, o Veja, um Polvo salteado e Rosbife de Atum.

Passou-se tempo suficiente para comermos uma boa entrada antes que nos fosse perguntado o que queríamos comer. De entrada “Lombinhos de Chicharo dos nossos mares sobre bolinhos de milho com chouriço regional regados com escabeche de legumes, laranja e Açaflor”. Pedimos também o “Polvo Salteado em Alho Francês, as Batatas e umas Castanhas, a Salada e seu Molho” e “Rosbife de Atum em Crosta de Sésamo sobre Tetragonia Salteada, Batata Doce Assada e Compota de Tomate Picante”. Para a miúda, um prato do menu infantil que dava pelo nome de “Dona Clotide”, bife de frango com tagliatelle.

Alguns, largos, minutos depois, vem a nota da cozinha: “Atum não temos. Quer outra coisa?”. Esta seria a altura correcta para sair, só pela atitude mas enfim… Pedi a carta novamente. A pessoa que nos estava a atender estaria certamente convencido que eu tinha decorado toda a ementa anteriormente. A carta foi deixada na mesa junto com a de vinhos que entretanto também tive que pedir e quem nos servia voltou a desaparecer. Não sei se 10, se 15 minutos, foi o tempo que demorou até que voltasse a nós. Estaria o prato do primeiro pedido a ser feito? Pedimos outro prato de Polvo.

Queixas de restaurantes? Ainda antes da comida chegar?

Entretanto, nas mesas em redor que foram sendo preenchidas, notava-se igual desconforto. Clientes locais, comentavam o incómodo do tempo a que estavam já à espera sem serem atendidos ou à espera de comida. Vi mais do que uma vez quem se levantasse em direcção à sala de recepção. Iriam procurar alguém que os servisse? Talvez. Vinham sempre acompanhados.

Vem a entrada. Os lombinhos de Chicharro são uma boa aposta da casa mas o escabeche de legumes ganhava a ser substituído por uma salada fresca. É só não aquecer os legumes ok?

Lombinhos de Chicharo no Ambientes com Sabores

Eis que surge o frango. Seco. Muito seco. E nada mais a dizer.

Chegou mais tarde o polvo. Ainda que ambos os pedidos fossem iguais, quase não o pareciam. Os cortes do Polvo eram diferentes o quanto baste para ter tal impressão sem ser necessário reparar nas folhas de vegetais que compunham os pratos e que em cada um continham espécies diferentes. Cortes à parte o molusco estava saboroso, nem muito rijo nem feito em papa mas já as castanhas que o acompanhavam estavam secas por demais e as batatas cozidas pouco ou nada acrescentavam ao prato. As queixas nas mesas circundantes continuavam. Pratos a chegarem sem tão pouco ter por lá passado o couvert? Nem um pedaço de pão para a história?

Polvo no Ambientes com Sabores

A noite já ia longa. Pedimos a carta novamente para escolher uma sobremesa e a escolha recaiu sobre o “Pudim de Queijo com Crumble de Amêndoa e Calda de Castanhas”. O que nos foi servido foi essencialmente uma Panna Cotta com duas castanhas (que se quentes custavam a digerir, geladas tornavam a tarefa muito mais difícil), migalhas de algo que não conseguimos descortinar (deusas, Crumble não é sinónimo de migalhas) e uma calda que podia ser agua de cozer castanhas com açúcar. Se era? Não sabemos.

Pudim de Queijo????

Pedimos a conta. Cerca de 7 minutos depois, e na falta de quem viesse trazer a conta, fomos nós até ao balcão. Abro a carteira e tiro o multibanco. “O Multibanco está fora de serviço.“. Ao ouvir isto, e depois da experiência só me restou dizer que nos podiam ter informado antes. A resposta foi um lacónico “Está afixado à entrada!”.

Multibanco fora de Serviço?

Tendo a certeza de não ter visto tal anuncio, sai para levantar dinheiro na caixa mais próxima e ao regressar vejo o anuncio diminuto preso num placar onde se encontram muitos outros anuncios sobre as mais variadas coisas, a comum placar para onde ninguém iria olhar. Subo novamente ao primeiro andar, e ao pagar faço questão de referir que ninguém veria o tal anuncio. Tive silêncio por resposta. Perante tal indiferença disse que eu faria questão de dizer ao mundo que o Multibanco não funcionava. Isso e muito mais. Um olhar de soslaio e um “humpf” foi o que ganhei.

Gerir um restaurante não é só comprar toalhas bonitas e encher a dispensa. É também escolher os empregados.

Curioso foi o facto de outro dos empregados do restaurante estar mesmo atrás, ter ouvido os comentários e não ter perguntado ao menos o que se passava, qual a razão do desagrado. Talvez pela mesma razão pela qual ninguém pergunta se está tudo bem ou se ficámos satisfeitos…

Por esta experiência pagámos 69.60 euros. E nem a porcaria da vela (já quase queimada) no candelabro da mesa me acenderam?

Para ser diferente não é preciso muito. Basta fazer asneiras que os outros ainda não tenham feito. Mas fazer asneiras comuns? Isso não basta para ser diferente. É parvo. Só isso. E se isso não é bom em lado algum, numa ilha pequena como esta será pior ainda. Quanto tempo demora até que toda a gente conheça o serviço? E depois? Quando já ninguém quiser voltar?

Restaurante Ambiente com sabores
Não interessa o resto. Se quiserem saber onde é, procurem. Não vou correr o risco de depois dizerem que fui eu que vos indiquei a morada.

Um destes dias, fiz o upload de uma fotografia para várias redes sociais acompanhando-a de uma legenda: “É decadente… Literalmente… Como se quer. Foi uma surpresa…“. Entenda-se antes demais que eu gosto particularmente do termo decadente. Associo-o ao movimento artístico e literário do séc. XIX. Associo-o a Oscar Wilde e a Charles Baudelaire… “Decadente, como se quer” é certamente, vindo de mim, coisa boa.

E coisa boa era efectivamente aquilo que nos esperava no restaurante The Decadente.

Depois de uns minutos de fim de tarde passados num banco de jardim ao Miradouro de São Pedro de Alcântara, eis que chegava a hora da surpresa que a Susana tinha preparado. Jantar. Só não sabia onde. Virar costas à paisagem, atravessar a rua que partilha o nome com o miradouro e chegar ás portas de um palacete, que no inicio do século passado terá sido construído para ser a residência oficial de um embaixador. Percebe-se a nobreza do edifício, e dificilmente se passará por ele sem o notar. É aqui que se encontra um dos mais recentes hostels de Lisboa, o The Independent. Portas passadas, virar à esquerda. é por aqui a entrada para o The Decadente.

Um bar, balcão de bancos altos, que por pequeno que pareça deixa alas abertas para as salas que se seguem. Dois copos de um fresco Rosé, sugestão da casa, que os jantares só se servem das 20 às 22 e das 22 em diante. Uns minutos de relaxe, copo na mão, apreciamos os espaço e a decoração que de alguma forma nos chamava à tal decadência que referi anteriormente. Como se quer.

Uns minutos depois é-nos proposta a passagem à sala de refeição. Seguimos o chefe de sala e ocupamos a primeira mesa. Em frente há também um pátio de mesas postas. Em breve estará cheio. Ficará para outra visita. O chefe de sala passa-nos ao Felipe, que acompanhará a nossa mesa e educadamente de dispõe a esclarecer qualquer duvida sobre a ementa que deixa na mesa. E começa a escolha.

O pica pau do The Decadente

As entradas no The Decadente são chamadas de “Conversas do Miradouro”.

A oferta é larga entre cremes de legumes, uma salada, dois carpaccios, camarões e a nossa escolha: “The Pica-Pau”. Pequenos pedaços fatiados de carne de novilho, cozinhados ao ponto com alho e mostarda antiga. A acompanhar, pedaços de pão bem fresco que pediam para ser banhados no molho. Bom, muito bom. Carne macia, dose certa para entrada. Venha então o resto.

Um prato de peixe vinha a calhar numa noite como aquela. “Há mar e mar, há ir e voltar” sugere 5 pratos vindos da agua. Um deles chamou à atenção pela ousadia: “Peixe da noite”. Lombo do peixe do dia em sautée, batata migada com alho e coentros e couve pak choy grelhada.

Talvez nem todos os peixes do dia sejam a melhor opção para um sautée mas ainda assim, resolvemos arriscar. Pampo. Excelente. Sendo um peixe de carne branca e firme, permite-se ao salteio sem grande risco.

Peixe da noite no The Decadente

Bem apresentado, a posta em bom tamanho não desiludiu. Na batata, saborosa, o que nem sempre se prova, o alho estava suave e o coentro dava um toque de cor. A couve, não tendo um “aperto” suave antes da grelha, pedia só menos um ou outro talo um pouco mais rijo. Ainda assim, rica de sabor, acompanhava perfeitamente.

Satisfeitos, e sempre acompanhados pelo serviço irrepreensível, passamos então ao prato de carne.

“Do interior para a cidade” é a lista de escolhas do restaurante.

Entre costeletas, bifes e bochechas, optámos pelo “Confit no Pato”. Perna de pato confitada com couscous de cogumelos Portobello e salsa, molho de soja e chalotas caramelizadas com laranja e tomilho.

Pato Confit do The Decadente

Pato confitado é outra escolha ousada. Horas de cozedura antecedidas de horas de preparação. Veio a rigor.

Muito bem apresentada, veio a perna do pato, brilhante e bem guarnecida de molho, encorpado quanto baste com um agridoce entre o salgado do molho de soja e o doce da laranja. As chalotas caramelizadas contribuíam para maior doçura. Os couscous, que admito até à data não ser grande apreciador, encantaram também. Muito além da tipíca cozedura, os pequenos grãos de massa estavam num ponto certo de secura onde os cogumelos e a salsa combinavam maravilhosamente. Quanto à carne, irrepreensível. Saborosa, a soltar os nacos sem perder a forma.

Era de pedir a sobremesa. Havia também boa escolha entre tartes, bolos e fruta mas a nossa recaiu sobre “De Seia para Lisboa”, um cheesecake de queijo de Seia e compota caseira de tomate. E que boa foi a nossa escolha.

O Cheesecake do The Decadente

Uma base do conhecido Cheesecake, sem demasiada humidade, crocante e apelando à ideia de biscoito, coberta por uma boa fatia de queijo de Seia e depois regada com uma geleia de tomate que pelo pouco doce e acertada dose de canela, combinava perfeitamente com tudo o resto. Excelente.

De beber, foi escolhido um Douro Vinha do Bispado. Um tinto de aroma adocicado, de vermelho transparente e com um final fumado e muito agradável. Também aqui a satisfação foi de monta.

Faltava a prova de fogo. O garoto clarinho que certamente já aterroriza algumas casas de Lisboa. O pedido é claro. Um café e um garoto clarinho. Leite quente com uma só gota de café. Veio e falhou. Um pouco mais escuro do que o esperado. Nem isso nos desanimou. Coisa que nem sempre vejo nestas situações, a Susana com um sorriso, pede que nos tragam outro, ou até só leite. Uma vez mais, com a simpatia que marcou a sua presença durante o jantar, o Felipe pede que lhe seja dada outra oportunidade. Trará mais um garoto. Veio perfeito.

Decadente. Como se quer.

Em casa cheia e onde nem por isso nos sentimos apertados, a gestão de reservas parece funcionar ao mais pequeno detalhe. Em pé só quem está a ser encaminhado para a mesa. Os tempos perfeitos levam a refeição a durar até ao próximo turno e nem se dá por isso. Numa noite como só em Lisboa, que chamava a ser vivida, a experiência que vivemos no The Decadente foi fantástica. A repetir certamente.

Restaurante The Decadente
Tipo de cozinha: Portuguesa Contemporânea
Horário: Das 12:00 às 15:00 ao almoço e das 20h00 às 24:00 para jantar.
Preço médio: 25€
Morada: Rua de São Pedro de Alcântara, 81
1250-238 LISBOA
Telefone: +351 213 461 381
Site: http://thedecadente.pt/